2008/09/30

Às vezes

quero escrever e não consigo. Às vezes é porque me faltam as palavras no geral, se bem que isso aconteça menos vezes que o faltarem-me as palavras em português, uma língua tão rica e no entanto tão matreira que torna difícil traduzir coisas tão simples como enjoy, indulge e bliss sem que estas ganhem um segundo sentido malicioso.
Às vezes, ainda, não escrevo porque é melhor não o fazer, porque os sentimentos são tão fortes que me trariam toda para aqui, com o meu amor, que é aceitável, e as minhas raivas, de que cedo me arrependo (e frequentemente não apago antes que quem não os deve ver os veja). Outras vezes, é tão só porque o redemoinho de emoções não tem forma de parar e eu corro o risco de ser inadvertidamente atirada para o lado contrário de onde quero ir.
E às vezes, aquelas que custam mais, é porque não me deixam.

2008/09/29

Sublime

era a brisa que corria há pouco, quando desci, e que exalta suavemente a chegada do Outono.

2008/09/26

Já está


lá em casa, e eu mortinha por ir a correr para lá. Como dizia ontem, pouco antes da meia noite, nem tudo é mau, porque a noitada garantiu-me o direito de ir para casa mais cedo e poder passar por lá e dar-lhe uma espreitadela antes da saída da sexta-feira à noite. Não é linda? (desculpem lá, mas como eu também sou o gajo lá de casa tenho direito a fazer cenas destas).

Eu tenho que me deixar de literaturas

e começar a ler só jornais cheios de factos concretos, provados e por provar. E manuais de coisas úteis, práticas, sensatas e sensaboronas que não engordem (que até os livros de cozinha me enchem de ideias idiotas sobre jantares a dois ou a três ou mais com alguém que consiga apreciar o que é bom).
E atenção, as revistas também não são boa companhia, porque nos dizem como ser bonitas e sensuais e boas namoradas e amantes e mulheres e mães e profissionais tudo ao mesmo tempo e afinal aquilo são só casos que acontecem a algumas pessoas apenas porque têm que acontecer e ninguém é igual a ninguém (e mesmo que copiemos as experiências dos outros elas serão só uma cópia fajuta de uma situação única vivida por outros).
Mas, na verdade, eu, que pouco ligo às revistas e gosto mesmo muito mais de livros, do papel dos livros, do cheiro dos livros, do rosto dos livros, das letras arrumadinhas em palavras, frases e capítulos dos livros e, acima de tudo, das histórias que os livros me contam, tenho mesmo é que os pôr de parte de vez, deitar as estantes pela janela, juntar-lhe as outras prateleiras cheias daquele papel gravado a imaginação e seguir com a minha vida.
Tudo porque, cada vez que tomo uma decisão importante, e desta vez foi a de desistir, de vez, dou de caras com uma frase que me deixa na dúvida e me faz voltar atrás. Damn, damn, damn you, Ian McEwan e o absolutamente fabuloso On Chesil Beach. "And that's how the entire course of a lifetime can be changed – by doing nothing"*. E foi aqui que fiquei com vontade de voltar a fazer alguma coisa. Apenas porque ainda tenho o direito de escolher a forma como quero mudar a minha vida e não consigo resignar-me a não fazer nada.
Foto daqui.
*"E é assim que o curso de uma vida inteira pode ser mudado – não fazendo nada."

2008/09/25

Nem tudo é mau,

mesmo quando às 23:39 ainda estamos a trabalhar sem ver o fim ao processo e até um mosquito afoito nos pousa na brancura de uma página de edição de texto, sujeito a uma morte motivada quer pelo asco à espécie, quer pela vontade que temos de despejar a ira acumulada durante mais de duas semanas. Nem tudo é mau mesmo quando vemos que os louros do nosso trabalho saltarão de mão em mão até chegarem às cabeças de outros que por razões obscuras parecem ser mais dignos de os merecer. Nem tudo é mau porque há quem já tenha percebido a verdade, apesar de nada poder fazer. E nem tudo é mau, porque mesmo aqui em frente o Tejo espelha a luz de Lisboa nas águas quietas e eu tenho a sorte de poder estar virada para ele.

2008/09/22

Desligada

É em alturas de trabalho como estas que me dava mais jeito ter um gajo cá em casa, para se preocupar com aquelas coisas para as quais não tenho tido mesmo tempo. Para começar, acho que nem precisava de pedir, pois a criatura não passaria sem aquilo, nem que fosse só por um bocadinho e por causa do futebol mas, se fosse o caso, passava-lhe o dinheiro para a mão e mandava-o comprar-me um televisor novo, para substituir aquele que está irremediavelmente avariado há uma semana. Há coisas para que os homens dão (e têm, pronto) mesmo jeito. E para as quais agora eu não tenho tempo.
Foto daqui.

2008/09/19

Infelicidade

Apanhou-me assim de repente. Uma brincadeira e pronto. "Passa-me lá isso a ver se não trabalho no fim de semana", esquecendo-me do compromisso que tenho pelo meio. Acreditamos na resistência física, brincamos com o perigo e, numa fracção de segundo, um espirro mais forte que os do costume, um único que deixa o nariz inflamado e a garganta a arder, anuncia o que mais tememos: uma constipação. Daquelas que vai levar umas boas duas semanas a sair do corpo. Tudo isso a par de um inestético arranhão na testa e de uma imensa bolha no calcanhar quando vou ter que calçar uns sapatos novos já amanhã, prenunciam alguns diazinhos de bastante infelicidade. Raios!

2008/09/17

A Foz e a foz

É extraordinário como um simples pormenor pode mudar o sentido das coisas. Num post anterior, vejo-me a escrever "Foz" quando quero escrever apenas "foz" e logo causo em alguém saudades do sítio que não vê há tanto tempo. E se a palavra é a mesma, e o sentido o mesmo, o local e o sentimento definitivamente não o são.
A minha relação com a Foz começou bem antes de eu ter começado a dar ao Tejo a importância que dou hoje. Apesar de viver perto de Lisboa e de estar relativamente perto do rio a partir de uma certa altura, mantive-me sempre pela alturas de diferentes colinas de Lisboa, todas elas viradas para o "nosso" rio. A bem da verdade, a zona, para além dos diversos cais onde se apanhava o barco para ir para a praia quando ainda não tínhamos carro, não tinha muito para oferecer, para além de monumentos que, depois de vistos, estavam vistos.
Mas voltando ao que interessa, que é a Foz, a tal que eu fiz recordar, entrou na minha vida em 88. De repente, numa viagem, uma grande amiga minha conhece algumas pessoas do Porto e lá nos vemos nós, o grupo do costume, a caminho da Invicta para conhecermos os personagens num fim de semana de Dezembro. A partir daí, foi a paixão pela cidade, pelo rio, pelas cores, por tudo o que tinha que Lisboa não tinha e, sobretudo pela liberdade de estarmos ali totalmente livres, numa casa posta à nossa disposição, à boa maneira do Norte. Seguiram-se verões e mais verões em que, tradicionalmente, pelo menos uma semana era passada ali. E foi num desses dias que me apaixonei pela Foz.
Naquela tarde, o grupo (que foi aumentando com o tempo) dividiu-se. Uns queriam compras, na Baixa, os outros já não sei o que queriam, nem interessa. Só me lembro que — e esta imagem, que será para sempre a imagem que tenho da Foz, apesar de tudo o que lá vivi durante as várias visitas – ao regressar de eléctrico, a luz do pôr do sol (e todo aquele dia) criou uma magia tal sobre a água daquele rio, que é tão mais pequeno que o "nosso", que o tornou inesquecível.
Aqui, apesar de todos os dias ter um rio imponente como paisagem de fundo, de manhã à noite, com vista tanto para a ponte como para a foz, nada tem o espírito daquele momento. E mesmo sabendo que nada se repete, que os momentos se perdem e desfazem no instante em que acontecem, consigo guardar para sempre a imagem de um rio dourado quando o eléctrico começou a descer a rua em direcção à marginal, para nos deixar lá ao fundo, no Passeio Alegre, tão pertinho de casa.

2008/09/15

Sobre portas (mal fechadas) e janelas (entreabertas)

Diz-se por aí que quando se fecha uma porta (consta que é Deus que o faz, mas eu prefiro acreditar que somos nós mesmos que decidimos ou não fazê-lo) se abre imediatamente uma janela, criando-nos assim uma nova alternativa para, assim por dizer, arejar. E eu tenho, tenho arejado sim. O mais que posso. O mais que consigo. Saindo pela janelinha para todos os dias voltar a entrar e ver-me de novo por trás daquela porta que, apesar de fechada, ainda tem entalados junto à ombreira os restos da questão. Como se se tratasse de um refém que deixaste para um dia vir resgatar. Como se não conseguisses levar contigo aquele pedaço de ti que disseste ser feito de mim. Porque te recusas, porque sabes o que sinto e te sabe bem sabê-lo, a dizer-me "não" ou "chega" e te deixas ficar num silêncio cheio de culpa (a sofrer, eu sei). E aquele pedaço de ti, preso na ombreira e que não consigo arrancar, cria uma inevitável corrente de ar sempre que abro e fecho a janela. E é essa brisa repentina e fria que me arrepia e me faz chorar.
Foto daqui.

2008/09/10

By the river

Depois de almoço, abro o mail e uma mensagem salta à vista, entre as muitas que não interessam. "Cafezinho by the river", diz o assunto, e logo a seguir lê-se "quem quiser janta". Pois bem, estou a caminho para umas horinhas de conversa bem disposta, um jantar levezinho como manda a boa forma e um regresso a casa mais tarde que o habitual. Que se lixem o ginásio, as compras semanais de frescos e os assuntos corriqueiros. Ainda é verão e, sobretudo, é Setembro.
Até amanhã.

2008/09/09

Instante

Ainda há pouco, quando cheguei cá acima e olhei para o rio, reparei que a ponte estava de um vermelho mais vivo, que lhe era dado pelos tons quentes do sol que se escondia lá ao fundo, na Foz. Foi só um instante, um relance para dentro da sala, a despedir-me de quem já foi, para novamente o aço ficar baço e vermelho escuro e para o rio, cujo azul ainda brilhava, ficar cinzento e monótono. E como tudo o que é bom não pode ser se não efémero, temos que pôr toda a nossa alma nelas, sem distracções. Mesmo que volte amanhã, não será nunca igual, mas tornará, de certeza a passar num instante. Pena que esta saudade não passe assim.

2008/09/08

Vida leve

Agora, que tudo acabou, aquelas relações voláteis esmiuçadas nas plásticas revistas cor-de-rosa que se folheiam nos dias de praia, quanto mais não seja para saber quem está no areal ao lado, surpreendem-me ainda mais. A deixou B, porque sim e porque acabou por ficar com C. Num dia amam-se e não sabem viver um sem o outro, no dia seguinte já amam outro qualquer, que por acaso até já amou uma amiga qualquer, que acabou por se envolver com o famoso qualquer coisa X, em intermináveis polígonos amorosos e, sobretudo, mediáticos.
Depois do que senti e me envolvi, depois do que me dei, custa-me ainda mais entender como é possível pôr para trás assim uma relação que parecia tão profunda e partir imediatamente para outra, que tapará o vazio existente. Não podia ser amor o sentimento que existia, nem aquele que supostamente se passa a ter. Serão, quando muito, atracções muito convenientes. Não se fica disponível assim, não se recupera a energia para partir para uma nova relação, amar com este ânimo leve não é amar.
E, como ainda estás em todos os meus gestos, os meus adormeceres, os meus despertares, todos os meus momentos ainda, vou arranjando alternativas solitárias para preencher as horas que eram tuas, voltando à minha rotina, sem vontade de ninguém (à excepção de alguns bons amigos) que substitua o insubstituível. Vivo uma vida leve, o mais possível, mas nunca fútil.

2008/09/04

Setembro

Agora, quando desço a rua que me leva à calçada que depois me trará para casa, pelo melhor e mais relaxante percurso alternativo de Lisboa, a menor altura do sol no céu já faz com que este me encandeie ao mirar-se vaidoso no espelho retrovisor, quando há um mês atrás ainda passaria por cima do tejadilho e se reflectiria apenas nos telhados ou nos andares mais altos das casas logo em frente. A cor do rio por trás do meu monitor também já está diferente, mesmo durante o dia, com um azul mais escuro e profundo, que reflecte um céu menos quente. A chilreada na rua é menor, até porque já passaram os exageros do verão, e eu fico um bocadinho mais animada, porque este tempo menos exultante está mais em consonância com o que sinto neste momento. Saudade, tristeza e vazio. Mas o meu Setembro chegou, finalmente.

2008/09/03

De volta

De volta, no meu último dia de férias, sinto que, não fosse a primeira semana de férias, e apesar de ter tido muita animação e companhia nos dias que por cá estive, este ano foi aquele em que senti que os meus dias inúteis foram exactamente isso mesmo: inúteis. Agora, resta-me esperar uns bons meses pelas próximas.