2006/04/07

Acho que sim.

Então Queres Ser Escritor?

se não vem de rompante de dentro de ti
apesar de tudo,
não o faças.
a não ser que surja sem o esperares do
teu coração e mente e boca
e entranhas,
não o faças.
se tens que te sentar durante horas
fixando o ecrã do computador
ou curvado sobre
a máquina de escrever
à procura de palavras,
não o faças.
se o fazes por dinheiro ou
fama,
não o faças.
se o fazes porque queres
mulheres na tua cama,
não o faças.
se tens que te sentar e
reescrever uma vez e outra,
não o faças.
se te for difícil sequer pensar
em fazê-lo,
não o faças.
se estás a tentar escrever como outro
qualquer,
não o faças.

se tens que esperar para que ruja de dentro
de ti,
então espera pacientemente.
se nunca ruge para fora de ti,
faz outra coisa qualquer.
se precisas de o ler primeiro à tua mulher
ou à tua namorada ou namorado
ou aos teus pais ou a outro alguém,
não estás pronto.

não sejas como tantos escritores,
não sejas como tantos milhares de
pessoas que se intitulam escritores,
não sejas chato e aborrecido e
pretensioso, não te consumas com
auto-estima

as livrarias do mundo
bocejaram
de sono
com o teu género.
não sejas mais um.
não o faças.
a não ser que saia da
tua alma como um foguetão,
a não ser que estar parado
te levasse à loucura ou
suicídio ou assassínio,
não o faças.
a não ser que o sol dentro de ti
esteja a queimar as tuas entranhas.

quando for o momento certo,
e se tiveres sido escolhido,
far-se-á
por si só e continuará a fazer-se
até que morras ou morra em
ti.

não há outra forma.

e nunca houve.

Charles Bukowski
de new poems book 1, Virgin Books, 2003

Belo dia para começar de novo. Já passa da meia noite e ainda estou na agência, à espera nem sei bem de quê. Por isso, pus-me a passear e dei com este poema, numa página que encontrei a partir de um link no There's Only 1 Alice.

É engraçado como sem querer, ou sem saber que queremos, encontramos inesperadamente coisas que nos dizem muito, que nos fazem perguntas em cuja resposta nunca pensámos. Não sei muito de Bukowski, como não sei de muitos outros, mas as suas palavras puseram-me à procura de sóis ardentes nas minhas entranhas e fizeram-me sentir que há qualquer coisa em mim cheia de vontade de sair. Ainda não sei o que é, não sei se serei chata ou aborrecida, nem se farei bocejar de tédio os livreiros e leitores, mas parece-me, cada vez mais, que a resposta à pergunta é sim. Acho que sim. Só estou à espera do momento certo.

(Na tradução há uma coisa ou duas que não me agradam, mas foi feita sem dicionário. Logo se melhora. Já agora, só faltam 20 dias.)

3 comentários:

S. disse...

Ias muito bem até voltares a contar os dias.
Pára lá com isso! Pelo menos dessa forma negativa. Pensa que cada dia que passa tens mais experiência, sabes mais coisas e te tornas uma pessoa com mais conteúdo.
Quarinta é lindo. Quando eu chegar lá, também quero fazer quarinta.
Beijos.

Rosmaninho disse...

A contagem dos dias tornou-se apenas uma brincadeira, já me é indiferente fazer quarenta ou quarinta ou o que quer que seja. Estou viva e sinto-me bem, embora solitária por vezes. Mas sou feliz como sou, e isso é que é importante.
Beijos

S. disse...

FESTA!!!!!
;)